Amazônia registra aumento até junho e situação pode se agravar
O Sistema Deter do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) constatou que o desmatamento na Amazônia totalizou .090 km² de área desmatada no primeiro semestre de 2025, um crescimento de 27% na comparação com o mesmo período do último ano. Em junho, o Deter registrou 458 km² de área desmatada na Amazônia, a menor área de alertas de desmatamento em junho já registrado pelo Deter B, porém também com a maior porcentagem de cobertura de nuvens. Os estados mais afetados foram Mato Grosso (206 km²), Pará (111 km²) e Amazonas (100 km²). Nos seis primeiros meses do ano, o Mato Grosso lidera o ranking de desmatamento no período, com mais de 1.097 km², um aumento de 141% em relação aos primeiros seis meses de 2024.
Entre 1º e 27 de junho, 39% dos alertas de desmatamento ocorreram em duas categorias específicas: Florestas Públicas Não Destinadas (17,5%) e em áreas sem registro fundiário (21,4%), segundo o portal Terra Brasilis, apontando para a necessidade de destinar e proteger essas áreas. As propriedades privadas concentraram o maior volume de desmatamento no mês, respondendo por 43,5% da área total. Esse padrão se mantém no acumulado do semestre até 27 de junho, quando as propriedades privadas foram responsáveis por 39% da área desmatada, cerca de 795 km², um aumento de 81% em relação aos 439 km² registrados no mesmo período de 2024. “O aumento do desmatamento na Amazônia neste semestre pode refletir a expectativa de proprietários rurais, especialmente no Mato Grosso, de possíveis mudanças que enfraqueçam acordos e legislações ambientais hoje fundamentais para conter o desmatamento na região. Um exemplo é a Moratória da Soja, acordo multissetorial que há 19 anos tem desempenhado papel central na redução do desmatamento associado à cadeia da soja na Amazônia, mas que atualmente enfrenta intensos ataques políticos e jurídicos. Soma-se a esse contexto, ainda, a tramitação do ‘PL da Devastação’ [PL 2159/2021], que propõe flexibilizações no licenciamento ambiental e pode facilitar a expansão do desmatamento, agravando ainda mais o quadro de destruição da floresta”, analisa a porta-voz de Florestas do Greenpeace Brasil, Ana Clis Ferreira.
A Moratória da Soja é um acordo multissetorial em que grandes compradores se comprometeram a não adquirir soja proveniente de fazendas com áreas desmatadas na Amazônia após 2008 e, nessas duas décadas, se tornou um dos principais instrumentos de proteção ambiental no bioma. Reconhecida globalmente, conciliou a expansão agrícola em larga escala com a sustentabilidade ambiental. Entre 2009 e 2022, os municípios monitorados pelo acordo registraram redução de 69% no desmatamento, mesmo com aumento de 344% na área plantada de soja. Na safra de 2022/23, menos de 4% da soja monitorada estava fora de conformidade. Apesar de eficiente, a Moratória da Soja sofres ataques por parte do agronegócio brasileiro e políticos ligados ao setor. Estados como Mato Grosso, Rondônia e Maranhão aprovaram leis que restringem incentivos fiscais e outros benefícios para empresas e produtores que aderem a acordos ou compromissos voluntários que visam estimular práticas mais sustentáveis do que o patamar mínimo legal, além de um Projeto de Lei de igual teor tramitando no Congresso Nacional. O cenário se agravou com a abertura de uma investigação pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), que apura se o acordo configura prática anticompetitiva, o que pode resultar em sua suspensão preventiva e em sanções às empresas signatárias. “Os ataques à Moratória da Soja não são técnicos, são políticos, beneficiando quem mais lucra com a destruição da Amazônia. Permitir o desmonte de um acordo eficaz, reconhecido internacionalmente e construído ao longo de quase vinte anos, em nome do desmatamento livre, é um tiro no pé. Proteger a floresta é preservar o clima, as chuvas que sustentam a produção agrícola e a segurança hídrica de milhões de pessoas, incluindo os próprios produtores”, diz Ferreira.
Além de colocar em risco quase duas décadas de avanços e abrir caminho para o desmatamento descontrolado no bioma, a suspensão da Moratória da Soja também iria na contramão da resposta urgente que a crise climática exige, comprometendo não apenas o meio ambiente, mas o próprio futuro da agricultura brasileira, uma vez que a redução de chuvas provocada pelo desmatamento pode ter impactos severos sobre a produção agrícola, com perdas estimadas em até US$ 1 bilhão por ano até 2050”. Somando-se a esse cenário, avança no Congresso o PL 2159/2021, o “PL da Devastação”, que prevê a dispensa de licenciamento para diversas atividades agropecuárias e permite o autolicenciamento via Licença por Adesão e Compromisso (LAC), eliminando a análise prévia de impacto ambiental. Também restringe a participação no processo de licenciamento de órgãos federais de fiscalização e controle, como Funai, Ibama e ICMBio, aumentando, entre outras coisas, o risco de conflitos fundiários, grilagem e desmatamento em larga escala. “O PL da Devastação consolida retrocessos históricos, facilita violações de direitos de comunidades tradicionais e pode gerar graves prejuízos econômicos ao setor agrícola, ao aumentar a insegurança jurídica e agravar a destruição de ecossistemas essenciais para a regulação do clima e da produção de alimentos”, aponta Ferreira.