Segundo artigo publicado, no início de 2021, no Journal of CO2 Utilization por pesquisadores do Departamento de Engenharia Química da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli- USP), no âmbito do Fapesp Shell Research Centre for Gas Innovation (RCGI), o dimetilcarbonato (DMC), o ácido acético e o dimetil éter (DME) são os três produtos derivados do dióxido de carbono (CO2) com maior potencial para desenvolvimento e mais promissores para novos estudos.
A conclusão foi feita após estudo no qual se avaliou quais seriam os melhores métodos e ferramentas para realizar essa escolha, levando-se em consideração múltiplos critérios. “Tentamos desenvolver a nossa própria metodologia para fazer uma seleção um pouco mais rigorosa do que encontrávamos na literatura”, diz o engenheiro químico e doutorando Kelvin André Pacheco, primeiro autor do artigo.
Os pesquisadores atuam na área de conversão do CO2 em outros produtos a partir de reações químicas –, que começou a florescer apenas a partir de 2013. “Antes disso, quando se tratava de abatimento de CO2, só se falava em captura, sequestro e armazenamento, o CCS, de carbon capture and storage. Você separava ou capturava e armazenava o CO2 de alguma maneira”, conta a professora Rita Maria de Brito Alves, também autora do artigo e orientadora de Pacheco no doutorado na USP. “Foram surgindo perguntas do tipo: o que fazer com o carbono separado ou capturado? Vamos armazenar tudo? Temos capacidade? Qual a influência que o CO2 terá nos locais em que for armazenado?”
Com estas dúvidas, Congressos e trabalhos passaram a versar cada vez mais sobre captura e utilização de carbono, resumido pela sigla CCU, do inglês carbon capture and utilization. O uso do dióxido de carbono sem conversão já é conhecido há mais tempo, com sua aplicação, por exemplo, em solventes, na produção de refrigerantes ou em estufa de plantas. Nos últimos anos, a pesquisa busca a conversão química do CO2 em produtos com maior valor agregado. “É a utilização do CO2 como matéria-prima: usar o que é um rejeito, um gás de efeito estufa, que traz todos os problemas ambientais que sabemos, e transformá-lo em algo útil”, explica Alves. “A conversão química do CO2 em outro composto químico é uma reação desfavorável, sob o ponto de vista energético. É difícil de ser realizada”, pontua o engenheiro Antônio Esio Bresciani, pesquisador colaborador do Departamento de Engenharia da Poli e do RCGI, também coautor do artigo científico. “Outro aspecto importante é que a conversão, além de eliminar a emissão de CO2, precisa ser viável comercialmente. Não adianta viabilizar uma reação para um produto que não tenha mercado ou que tenha um valor menor”, acrescenta. Bresciani.
Os pesquisadores partiram de um universo inicial de 122 possíveis produtos, que foram submetidos a três etapas de seleção. Após a definição de critérios e das melhores ferramentas de análise multicritérios, passaram por uma avaliação na qual foram verificados itens como maturidade tecnológica do produto, taxa de utilização das moléculas do CO2 e a projeção de crescimento, incluindo preço. Do grupo inicial, foram selecionados em uma primeira triagem 23 e depois apenas oito. Entre esses oito, os pesquisadores definiram os três mais promissores. “Esses produtos têm uma projeção boa de crescimento na indústria, além de uma maturidade tecnológica intermediária”, afirma Pacheco.
Os três produtos derivados do CO2 selecionados pelos pesquisadores apresentam grande vantagem ambiental. O dimetilcarbonato (DMC), por exemplo, atualmente é produzido por rota convencional a partir de metanol e fosgênio, a qual apresenta diversos problemas, sendo o principal o uso do fosgênio - um gás extremamente tóxico e que gera como subproduto o ácido clorídrico –altamente corrosivo. Portanto, a produção de DMC a partir de CO2, em substituição ao fosgênio, é um método ambientalmente mais apropriado. Pode ser aplicado na fabricação de policarbonato, um tipo de plástico capaz de substituir o vidro, normalmente gerado a partir da indústria petroquímica. O processo possibilitaria diminuir 1.730 toneladas de CO2 para cada 10.000 toneladas de policarbonato produzidas, pois utiliza CO2 como reagente na etapa de produção do DMC. Caso toda a produção mundial de PC utilizasse esse processo, haveria uma diminuição em torno de 450.000 toneladas de CO2 por ano. O DMC também pode ser usado como solvente e aditivo de combustível.
Já o gás dimetil éter (DME) tem como uma de suas possíveis aplicações à substituição do diesel como combustível, o que abriria um grande mercado. E o terceiro produto, o ácido acético, é amplamente usado na indústria química como reagente. É o precursor do acetato de vinila, usado para fazer o PVA, outro tipo de plástico com numerosas aplicações, como em adesivos.
O artigo “Multicriteria decision analysis for screening carbon dioxide conversion products” pode ser lido em:
https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S2212982020310210