Lucro de telefônicas não pode inviabilizar acesso à água em Fortaleza
Mais uma vez, as operadoras de telefonia e internet tentam inviabilizar a implantação da planta de dessalinização de água marinha que será instalada pela Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece) na Praia do Futuro. Esta semana, a empresa Claro voltou a se manifestar na imprensa nacional, na tentativa de retomar uma discussão sem fundamentos, apontando riscos abstratos ao funcionamento da internet no país, supostamente relacionados à construção da planta de dessalinização em Fortaleza.
Pura falácia! A internet não vai cair e, seja na terra ou no mar, as infraestruturas da Dessal do Ceará não apresentam riscos para o funcionamento dos cabos submarinos de internet que operam na orla da Praia do Futuro. Essa afirmação está embasada e demonstrada tecnicamente em estudos divulgados amplamente pela Cagece durante todo o processo de discussão desse projeto, que teve início em 2017.
Neste contexto, é importante ressaltar que a Dessal do Ceará é uma política pública, planejada para diversificar a matriz hídrica durante os períodos de estiagem, que são comuns na nossa região. Inclusive, sem ela, o abastecimento da capital poderá ficar comprometido em situações críticas de escassez.
Nunca é demais lembrar que estamos na iminência de um novo ciclo prolongado de seca no Ceará, conforme anunciado pela Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme) durante reunião do Conselho Estadual de Recursos Hídricos (Conerh) e divulgado recentemente na imprensa cearense. De acordo com o órgão, o cenário é de forte El Niño, o que vai impactar diretamente a quadra chuvosa no Ceará, resultando em período de seca para o nosso estado.
Durante todo o período de discussão em torno da Dessal do Ceará, as empresas de internet nunca manifestaram interesse em participar das consultas e audiências públicas realizadas pela companhia. Vale destacar que a Cagece sempre conduziu o processo de implantação do projeto na praia do futuro de forma responsável, com total compromisso com a transparência e ampla divulgação de todas as etapas nos meios de comunicação oficiais, imprensa e demais instrumentos de participação democrática. Além disso, cabe ressaltar que esse processo sempre levou em consideração toda a legislação pertinente, buscando sempre as orientações e deliberações emitidas por órgãos competentes.
Prova disso é que, após recomendação da Anatel, órgão que regula o setor de internet no país, a companhia realizou alterações no projeto da Dessal do Ceará para garantir todo conforto para as empresas de telefonia e internet, conforme normas estabelecidas pelo próprio setor de telecomunicações para o funcionamento harmonioso entre todas as estruturas existentes em mar.
Hoje, de acordo com o projeto da Dessal do Ceará, a estrutura de captação de água marinha encontra-se a 567 metros de distância dos cabos submarinos, inclusive, uma distância maior que a recomendação do Internacional Cable Protection Committee (ICPC), órgão que atua na proteção de cabos submarinos e de infraestruturas subaquáticas no mundo todo. Mas o que poucos sabem é que essa distância não é respeitada entre as próprias empresas de telefonia e internet que possuem cabos submarinos na orla de Fortaleza. Inclusive, existe hoje cruzamento entre cabos submarinos dessas próprias empresas.
Não satisfeitas, as empresas de telefonia e internet passaram a levantar questionamentos descabidos sobre interferências entre estruturas na parte terrestre. Porém, em nenhum momento levaram em consideração as diversas outras estruturas, de diferentes serviços, que cruzam as redes das empresas de telefonia e internet. Para se ter uma ideia, existem hoje, na área terrestre de Fortaleza, 1.204 pontos de cruzamento entre redes da Cagece e das empresas de internet, 285 pontos de cruzamento entre redes de gás e internet e outros 85 pontos de cruzamento com redes de drenagem da Prefeitura de Fortaleza, sem nunca ter havido nenhuma interferência ao funcionamento dos serviços das telefônicas. Atualmente, todas coexistem e funcionam normalmente.
Após toda discussão, a Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC) resolveu intermediar o debate com as empresas de internet que operam na Praia do Futuro, as quais sentaram à mesa para conhecer de perto o projeto e os estudos realizados, inclusive com total abertura para um diálogo de proposição. Porém, quando tudo parecia caminhar para o consenso, a Cagece foi surpreendida com nova declaração pública do vice-presidente Institucional da Claro, desta vez, contrariando e desfazendo todo o diálogo construído nas reuniões realizadas na FIEC com participação do presidente da instituição, Ricardo Cavalcante, representantes da Cagece e de diversas telefônicas.
Para se ter uma ideia, há cabos submarinos que chegam na Praia do Futuro e avançam por 12 km em área terrestre, até a avenida 13 de Maio, onde está localizado o datacenter da empresa Claro. Da mesma forma, existem hoje cabos submarinos que aportam na região do Caça e Pesca e percorrem por terra até a Praia do Futuro. Ou seja, uma situação que evidencia problemas conceituais, por não haver controle e ordenamento para evitar que cabos submarinos avancem no continente; e uma estratégia de mercado, que está tornando a Praia do Futuro uma região sensível para instalação de qualquer outra infraestrutura, uma vez que cabos submarinos também estão virando cabos terrestres. Uma coisa é certa, não podemos considerar como submarina uma estrutura que avança por diversos quilômetros em área terrestre.
Sendo assim, aparentemente, podemos considerar que o planejamento operacional das empresas de telefonia e internet não levou em consideração a relação adequada com outras infraestruturas da cidade, pois não segregam cabos submarinos e terrestres ou, de fato, essas empresas executam uma estratégia para impedir que outras infraestruturas se instalem na região, evidenciando uma reserva de mercado.
Para a Cagece, a fala insistente de alguns gestores das empresas de telefonia e internet em torno desta falsa narrativa, construída por meio de um discurso que não possui sustentação técnica, exige também uma reflexão crítica sobre os reais interesses dessas empresas. Ao que parece, elas querem privatizar a Praia do Futuro, formando uma reserva de mercado, em nome de um lucro futuro, com pouca preocupação com o social.
Por fim, nunca é demais lembrar que os interesses privados jamais poderão estar acima dos interesses públicos, ainda mais quando se trata de acesso à água em um estado Semiárido e diante de mais um ciclo crítico de escassez hídrica que se anuncia.