Pesquisa mede desperdício em feiras livres de SP
O pesquisador Pedro Brancoli, da Universidade de Boras, na Suécia, lidera projeto que tem como objetivo analisar o desperdício de alimentos em feiras livres de São Paulo. A ideia é fornecer informações que deem suporte a ações de prevenção ao desperdício, mas que também possam colaborar com o manejo e a valorização destes resíduos. Além da universidade sueca, participam da iniciativa a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Universidade Estadual Paulista - Unesp, no câmpus de Tupã. “Um dos objetivos da Agenda 2030 é reduzir pela metade o desperdício de alimentos”, diz Pedro Brancoli, mas se não há dados apontando a situação atual é impossível medir se realmente está havendo redução do desperdício ou não, pondera.
A cidade de São Paulo tem atualmente 942 feiras livres, que funcionam de terça-feira a domingo, semanalmente. Na primeira ação do projeto, o grupo de pesquisadores elaborou uma estimativa da quantidade de alimentos desperdiçados nas feiras livres da capital paulistana. O grupo selecionou quatro feiras livres de diferentes bairros da capital (Mooca, Belenzinho, Pacaembu e Aclimação), cujo tamanho variava de apenas quatro a até 73 barracas. No final de cada feira, os resíduos eram recolhidos por funcionários das concessionárias de limpeza e levados para um galpão. Lá, uma equipe treinada pelo projeto realizava manualmente a gravimetria do resíduo, ou seja, a separação física, pesagem e categorização do lixo recolhido na feira, bem como o cálculo de sua porcentagem em relação ao total do resíduo gerado. “Uma dificuldade da pesquisa de resíduos no Brasil é que não existe uma padronização das categorias usadas no processo de gravimetria. Um dos objetivos dessa parceria com a Suécia é justamente desenvolver estudos que possam preencher essa lacuna de padronização”, explica a pesquisadora e doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Agronegócio e Desenvolvimento no câmpus da Unesp em Tupã, Paula Garcia Lima, que integra a equipe que realizou o processo de gravimetria do lixo das feiras paulistanas, aplicando os protocolos de separação e contabilizando cada elemento presente nos resíduos. No mestrado, Paula já havia trabalhado na gravimetria de resíduos domésticos do município de Tupã, mas focada na reciclagem. A pesquisadora notou uma lacuna sobre o tema na literatura científica, impressão que foi reforçada pelo trabalho nas feiras de São Paulo. “Para a análise de resíduos, quanto maior o número de categorias que nós conseguimos criar, mais detalhada será a informação sobre o percentual que eu tenho de cada resíduo”.
O trabalho de Brancoli determinou três níveis de categorias de gravimetria : No primeiro nível, os resíduos foram divididos em evitáveis, não evitáveis, embalagens e resíduos externos. A escolha dos termos segue orientações estipuladas pelo próprio Índice de Desperdício Alimentar publicado pela ONU, comenta o pesquisador. Os resíduos evitáveis são aqueles produtos que em algum momento poderiam ter sido consumidos, como uma fruta, mesmo que no momento da análise estejam podres ou sem condições de consumo. Já os resíduos não evitáveis são partes de alimentos que não podem ser consumidas, por exemplo, o bagaço de cana-de-açúcar ou a casca do coco. “Independentemente do momento ou do uso destes alimentos, ninguém consegue consumir uma casca de coco ou um bagaço da cana-de-açúcar. Uma maçã podre, por outro lado, poderia ter sido consumida em algum momento”, diz o pesquisador. A categoria das embalagens engloba os pacotes e caixas que são usados em feiras para embalar os produtos, enquanto o resíduo externo é o lixo levado até a feira, por exemplo, pelos consumidores, mas que não foi necessariamente gerado ali.
Um segundo nível detalhou o tipo do alimento – legumes, frutas, folhas, tubérculos, comida processada, etc. e o último nível menciona o alimento em si (cebola, alface, manga, tomate, etc.). O estudo apontou que a quantidade de resíduo variou de 17 kg a 34,6 kg por barraca, a depender do tamanho da feira livre analisada.
Os resíduos não evitáveis responderam pela maior parte do lixo recolhido em qualquer uma das feiras analisadas, variando de 9,6 kg a 14,9 kg por barraca. A segunda categoria com maior quantidade de resíduos foi o grupo de alimentos formado por folhas, flores e caules, com 3,9 kg por barraca. Embalagens totalizaram 3,6 kg por barraca e as frutas somaram 1,4 kg por barraca. O estudo mostrou ainda que aproximadamente 70% de resíduos gerados nas feiras livres pertencem às categorias de não evitáveis ou de embalagens, um dado importante para a aplicação de políticas públicas de compostagem de resíduos. Isso porque a maioria das embalagens não pode ser compostada, e a maioria dos resíduos não evitáveis, como bagaço de cana-de-açúcar ou casca de coco, necessita de cuidados extras para serem compostados.
Hoje em dia a Prefeitura paulista tem, em operação, cinco pátios para compostagem de resíduos, com capacidade para processar até três mil toneladas de resíduos por ano e onde os restos de feiras livres e podas de árvores são transformados em adubo que é aplicado em jardins e praças. Com a contabilidade das feiras livres selecionadas pelo projeto, os pesquisadores escalonaram os resultados para a capital paulista como um todo. Pedro Brancoli afirma que os resultados são importantes para mostrar o problema dos resíduos e do desperdício nas feiras livres. “O estudo foi bastante quantitativo no sentido de que coletamos e analisamos tudo que era descartado das feiras que selecionamos. Anteriormente, não tínhamos a menor ideia da quantidade ou da composição desse resíduo”, diz Brancoli. “Vejo o trabalho como um primeiro chamado para dar a dimensão de um problema que até então era completamente ignorado. Às vezes esse primeiro número é importante para iniciar um movimento.”
A próxima etapa do projeto prevê a análise das causas e dos fatores de risco para o desperdício dos alimentos. Segundo o pesquisador, a grande quantidade de folhagens e folhas individuais no lixo indica o descarte no decorrer do dia, para melhorar a aparência do produto, da mesma forma que se observa um alto número de tomates “machucados”, o que pode indicar problemas no modo como é realizado o transporte da fruta.