Luiz Gonzaga, presidente da Associação Brasileira de Empresas de Tratamento de Resíduos e Efluentes (Abetre), comenta que, independentemente do que o Governo planeja com a Medida Provisória que prevê a adoção de ações compulsórias voltadas ao enfrentamento da presente crise hídrica, é preciso analisar o problema de modo mais amplo: o Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) da União prevê que, em 2029, será necessária oferta de 380 milhões TEP (milhões de toneladas equivalentes de petróleo), representando crescimento de 2,9% ao ano, para movimentar a economia nacional.
“Assim, o problema atual, que pode agravar muito a crise econômica provocada pela COVID-19, "é apenas a ponta de um iceberg". Segundo o executivo, o plano do Governo enfatiza a necessidade de expansão das fontes renováveis, que podem chegar à participação de 48% do total da matriz energética. A iniciativa é da Frente Brasil de Recuperação Energética de Resíduos (FBRER), criada em 2020 pela Abetre, juntamente com a Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP), Associação Brasileira do Biogás (ABiogás) e Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (ABRELPE). "Já estamos trabalhando para explorar todo esse potencial energético alternativo", ressalta Gonzaga.
O dirigente cita dados do "Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2018/2019", publicado pela Abrelpe: foram geradas cerca de 79 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos, cujo volume tem potencial de produzir 14.500 GWh/ano de energia elétrica por processos de tratamento térmico, que representa cerca de 3% do consumo nacional, ou o suficiente para abastecer todo o Estado de Pernambuco ou Rio Grande do Norte, Paraíba e Alagoas juntos. O Brasil também comporta processos de tratamento biológico, pelos quais há um potencial adicional de geração de energia elétrica de 1.400 GWh/ano.
O presidente da Abetre diz que há estudos que constataram que cerca de 50% do total de resíduos sólidos urbanos gerados no País correspondem à fração orgânica, o que representa enorme potencial para o aproveitamento energético, por meio do biogás. Contudo, pouco mais da metade desse material é destinado para aterros sanitários, onde poderia haver o aproveitamento energético. Quase 80% do biogás produzido hoje no Brasil é oriundo de resíduos de aterros sanitários e estações de tratamento de esgoto. "Avanço para a desmobilização dos lixões são o Programa LIXÃO ZERO do MMA e o renovado Marco do Saneamento, sancionado em 2020, e que trouxe a participação da iniciativa privada nas licitações dos serviços de coleta, tratamento e destinação dos resíduos sólidos e a sua cobrança, o que é coerente, pois são uma utilidade nos mesmos moldes da luz, água, telefonia e internet", pondera Luiz Gonzaga.
Com investimentos que podem chegar a R$ 15 bilhões a partir da implantação de diferentes tecnologias, o processo de recuperação energética de resíduos proporcionará, também, a redução da geração de chorume nas unidades de disposição final; redução da geração de gases de efeito estufa, mitigando a emissão de 90 mil toneladas/ano de CO2 equivalente na atmosfera para cada mil toneladas de lixo tratadas, comparável com a emissão de cinco mil carros; e aumento da reciclagem de materiais contidos nos resíduos sólidos urbanos, a partir da melhor seleção ou separação, com a consequente preservação dos recursos naturais.