Estudo mostra relação dos cupins com altas temperaturas

05/10/2022
Os cupins são responsáveis pela decomposição da madeira, especialmente em locais quentes e com pouca umidade.

Segundo pesquisa da bióloga Amy Zanne, da Universidade de Miami, e recentemente divulgada na capa da revista Science, os cupins desempenham um papel fundamental na reciclagem da madeira em ecossistemas naturais. Sem a presença destes insetos, vários biomas teriam acumulado uma grande quantidade de matéria orgânica morta. Os cupins são responsáveis pela decomposição da madeira, especialmente em locais quentes e com pouca umidade, em que microrganismos, principais decompositores, são pouco abundantes em épocas da seca. 

Os participantes da pesquisa aplicaram o mesmo método experimental em 130 locais distribuídos nos seis continentes, com o objetivo de avaliar o comportamento de cupins em variadas diversas condições de temperatura e umidade. Na Unicamp, Amy teve o auxílio do ex-aluno André Mouro D’Angioli, que contribuiu com o artigo como parte de seu doutorado em Ecologia, defendido no Instituto de Biologia (IB) sob a orientação do docente Rafael Oliveira. 

D’Angioli comenta que a parceria internacional teve como objetivo constatar em quais áreas do planeta e em que condições climáticas havia uma maior influência de cupins – quando comparados às bactérias e fungos – na decomposição da madeira morta, e como esses bichos são afetados por alterações na temperatura e precipitação. “Esse é um dado relevante, porque a madeira é um importante componente de estocagem de carbono. Então, quanto mais rápido ela decompõe, mais rápido perdemos o carbono que está armazenado na matéria orgânica e mais rápido ele é enviado como gás carbônico para a atmosfera”, disse o doutorando. 

Caso as previsões sobre mudanças climáticas se confirmem, as áreas com climas mais quentes e secos, como as formações campestres e savânicas do Cerrado, irão se expandir. Como consequência, os ambientes em que cupins são importantes decompositores aumentarão e irão gerar cenário de retroalimentação em que a elevação da emissão de gás carbônico causará altos níveis das temperaturas globais. “Em termos práticos, estamos entendendo como funciona o sistema terrestre e a interface entre um componente biótico, que são os cupins, a vegetação e um componente abiótico, que é o clima”, explica Oliveira. “A gente precisa entender como esses elementos ciclam na Terra, especialmente o carbono, porque assim poderemos predizer o que acontecerá com diferentes ecossistemas, caso o clima se torne mais quente e mais seco”, complementa. 

A pesquisa teve como grande diferencial investigar a atuação dos cupins em regiões distintas e com diferentes níveis de temperatura e umidade. Como existe uma extensa distribuição biogeográfica de espécies de cupim em todo o mundo, focar o estudo em apenas um ambiente traria resultados bem menos eficientes sobre a atuação deles na decomposição de materiais orgânicos como a madeira. “Além disso, como nosso protocolo era simples e de fácil aplicação, puderam se juntar ao projeto desde alunos de pós-graduação até professores seniores. Isso nos permitiu ter uma rede de pessoas e aprender muito uns com os outros”, disse Amy.

O modelo de experimento conduzido pelos cem colaboradores consistiu em inserir blocos de madeira de um tipo de pinus nos seus respectivos ecossistemas, dos quais uma parte envolvida com uma rede de proteção para evitar que os cupins os comessem, enquanto outra parte exposta para a atuação dos insetos. Dessa forma, foi possível comparar a decomposição realizada pelos cupins daquela feita por microrganismos como bactérias e fungos, verificando quem possuía uma atuação mais relevante. “Eu considero este trabalho um modelo de planejamento, porque é muito simples, não envolve tecnologia, somente uma boa ideia e um desenho experimental padronizado e elaborado”, argumenta Oliveira. 

Nos experimentos conduzidos por D’Angioli, por exemplo, os blocos de madeira foram inseridos em oito áreas formadas por campo, savana e floresta, localizados em três regiões específicas do Brasil: a Serra da Canastra, em Minas Gerais, uma estação ecológica em Brasília e no município de Itirapina (SP). Após os preparativos e a instalação das armadilhas, em 2016, houve dois anos de trabalho de campo e outro para processar as amostras e obter os dados para escrever a tese, que focava na análise dos ciclos biogeoquímicos de elementos do cerrado. Amy e Oliveira realizam atualmente novas investigações sobre a sua importância para ecossistemas brasileiros. “O papel de regiões tropicais e savanas na estocagem e liberação de carbono ainda é muito pouco estudado. Como a Chapada dos Veadeiros possui esses ecossistemas, além de uma diversidade de cupins que determina a ciclagem de carbono a partir de diversos materiais, fez sentido para mim que essa nova etapa da pesquisa fosse realizada aqui”, finaliza a pesquisadora.