MPF e Greenpeace Brasil criticam PEC das Praias
O Ministério Público Federal (MPF) divulgou nota nessa quarta-feira, 4 de dezembro, onde reforça o posicionamento contrário à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2022, conhecida como PEC das Praias. A medida visa transferir terrenos de marinha – terras da União no litoral – para estados, municípios e ocupantes particulares. No documento, a Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do MPF (4CCR) aponta que a aprovação da emenda constitucional geraria impactos socioambientais graves. A discussão está na pauta de julgamento da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal de hoje.
Para o MPF, a emenda constitucional deve provocar a privatização das praias, ao permitir que empresas de diversos setores tomem posse desses territórios, como resorts e hotéis. Na prática, o cercamento dos terrenos, que não mais estariam sob a fiscalização da União, excluiria parte da população que não tem condições de pagar pelo acesso aos locais mais valorizados, prejudicando o acesso a bens de uso comum. O MPF alega que ao restringir o uso coletivo das praias, a proposta viola inevitavelmente direitos e garantias individuais de grande parte da população brasileira, além de ferir cláusula pétrea que impede que direitos e garantias individuais sejam abolidos. “A Constituição estabelece que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”, destaca trecho do documento.
O MPF destaca ainda que a legislação determina que os terrenos da marinha devem se adequar aos parâmetros de proteção ambiental, sendo possível à União retomar a titularidade plena quando o uso pretendido causar potenciais danos ao meio ambiente. O órgão afirma ainda que muitos desses riscos não são dimensionados adequadamente em licenciamentos realizados em estados e municípios, muitas vezes sujeitos a intensa pressão para acolher empreendimentos que promovem desenvolvimento econômico sem a necessária sustentabilidade socioambiental. “O avanço desordenado da urbanização tem o potencial de prejudicar a qualidade ambiental e de saúde da população. Para o MPF, a proposta não leva em conta as diversas populações que habitam as áreas costeiras, bem como seu papel na manutenção da paisagem em termos estratégicos e funcionais. Além disso, ao prever a extinção da faixa de segurança, a medida não considera a emergência de eventos climáticos extremos e nem o aumento dos riscos de erosão e de inundação nos terrenos localizados no litoral, por conta da expansão da ocupação das áreas costeiras”.
Para o MPF, a PEC 3/2022 também retira da União a possibilidade de reservar áreas para implantação de novos projetos ligados à nova matriz energética, como as eólicas e outras. “Projetos mais ambientalmente sustentáveis previstos para a zona costeira seriam prejudicados na medida em que o acesso de produtos, mercadorias, insumos teriam que acessar o território por propriedades privadas, submetendo o país à necessidade de desapropriação dessas áreas estratégicas à nova matriz energética”. Em setembro, a Câmara de Direitos Sociais e Fiscalização de Atos Administrativos em Geral do MPF (1CCR) já havia enviado ao Senado Federal nota técnica contrária à PEC das Praias. No documento, elaborado pelo Grupo de Trabalho Terras Públicas, o MPF sustentou que, além dos prejuízos socioambientais para a população, a iniciativa representaria riscos à segurança nacional e à segurança pública.
Outro que é totalmente contrário à PEC das Praias é o Greenpeace Brasil. “O adiamento da votação desse projeto na reunião da CCJ de hoje apenas prolonga o problema, que poderá ainda ser pautado na próxima semana e com chances de ser encaminhado para a votação no Senado Federal. Pescadores e pescadoras artesanais, ambientalistas e ativistas foram impedidos de acessar a sala da CCJ do Senado nesta quarta-feira (4), o que evidencia o desejo de não tornar esta discussão um espaço democrático”, disse Mariana Andrade, coordenadora da frente de Oceanos do Greenpeace Brasil.
Para a coordenadora, a sociedade tem nitidamente mostrado seu descontentamento com o avanço desse projeto, que ameaça um direito garantido em constituição. “A privatização dos terrenos de marinha é um retrocesso no acesso público de áreas litorâneas e também na proteção de ecossistemas essenciais para a adaptação às mudanças climáticas nas cidades costeiras. A subsistência de comunidades tradicionais caiçaras, povos indígenas, pescadores artesanais que vivem no litoral brasileiro está em jogo nesta discussão, afinal a PEC pode forçar essas famílias a deixarem suas terras, agravando desigualdades sociais e conflitos”.