Brasileiro desconhece economia dos oceanos

20/07/2022
Apenas 1% dos brasileiros têm conhecimento sobre os conceitos de “economia do mar” ou “economia azul”.

A Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, em parceria com a UNESCO e a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), realizou o estudo “Oceano sem Mistérios: A relação dos brasileiros com o mar”, para entender melhor como a população brasileira vê a importância do oceano para atividades econômicas, como a pesca, o turismo e a extração de minerais na costa. Ao todo, a pesquisa coletou dados de duas mil pessoas entre 18 e 64 anos, de ambos os sexos, de todas as classes sociais, nas cinco regiões brasileiras. 

Em uma escala de 0 a 10, o índice de reconhecimento da população sobre a contribuição do mar para as atividades econômicas é de 8,6. Entretanto, apenas 1% dos brasileiros têm conhecimento sobre os conceitos de “economia do mar” ou “economia azul”, que propõem uma visão mais abrangente e sustentável da relação entre a humanidade e o oceano. O resultado foi apresentado durante a Conferência dos Oceanos da Organização das Nações Unidas (ONU), realizada em Lisboa, Portugal, de 27 de junho a 1º de julho. “O estudo nos traz informações inéditas que mostram como a sociedade brasileira está conectada com o oceano e percebe a influência dele no seu cotidiano. A pesquisa nos mostra que as pessoas ainda têm muito a conhecer sobre a participação e a importância do oceano nas suas vidas e na economia. Nesse caminho, acreditamos que o conhecimento, a ciência e a inovação são fundamentais para buscar o equilíbrio entre a conservação do oceano, o bem-estar social e novas oportunidades econômicas”, explica Malu Nunes, diretora executiva da Fundação Grupo Boticário. 

O Brasil possui quase 7,5 mil km de costa e mais aproximadamente 5,7 milhões de km² de espaço marítimo chamado de Zona Econômica Exclusiva. O mar fornece 95% do petróleo, 80% do gás natural e 45% do pescado do País, além de contribuir com o turismo, geração de energia renovável e escoamento de 95% do comércio exterior brasileiro. Segundo dados da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar, órgão do Governo Federal que reúne representantes de 15 ministérios, o mar gera R$ 2 trilhões anuais ao Brasil, o que representa 19% do Produto Interno Bruto (PIB). O cálculo considera a produção de petróleo e de gás, a defesa, os 235 portos do país, o transporte marítimo, a indústria naval, a extração de minérios, além do petróleo, o turismo, a pesca, as festas populares ligadas ao mar e a culinária marinha. De acordo com projeção da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a atividade econômica ligada ao Oceano em todo o mundo deve chegar a US$ 3 trilhões até 2030.

As atividades desenvolvidas a partir do uso e/ou exploração de recursos marinhos – como pesca, aquicultura, extração de petróleo, transporte marítimo de cargas e passageiros e até atividades náuticas recreativas, esportivas e culturais – compõem a Economia do Mar. Tais atividades são desenvolvidas de forma sustentável, inclusiva e considerando o uso e a conservação do oceano, elas também se enquadram na Economia Azul. A pesquisa mostrou que 86% das pessoas não conhecem os termos Economia do Mar ou Economia Azul. Apenas 1% disse conhecer bem os conceitos, enquanto 13% já ouviram falar. Quando questionados sobre atividades econômicas relacionadas ao oceano, de forma espontânea, os entrevistados destacaram principalmente a pesca (58%), o turismo e a hotelaria (27%), a extração de minerais (25%) e a logística e o transporte de pessoas e mercadorias (22%). A pesquisa destaca ainda o número significativo (25%) de pessoas que não souberam apontar atividades econômicas relacionadas ao oceano.

Algumas atividades com grande potencial econômico são pouco associadas ao oceano, como geração de energia renovável (6%) e produção industrial (4%). “É provável que esse desconhecimento também se reflita de alguma forma entre os próprios empreendedores e investidores. Temos o grande desafio de produzir e compartilhar conhecimento, ampliando a conexão das pessoas com o mar e seus diversos ecossistemas. Importante realçar que o futuro dos negócios e das agendas sustentáveis em todas as áreas passa pelo conhecimento da Economia Azul, uma vez que o oceano está conectado com a água dos rios, o ciclo da chuva e a regulação do clima no planeta, o que impacta indiretamente atividades longe da costa, como a agropecuária”, comenta Ronaldo Christofoletti, professor do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), copresidente do Grupo Assessor de Comunicação para a Década do Oceano da Unesco e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN). 

O professor destaca ainda o potencial biotecnológico desconhecido pela maioria sobre os oceanos. Pesquisas indicam que estão no oceano respostas e curas para boa parte das doenças que existem e que venham a existir, com grandes possibilidades para o desenvolvimento de novos fármacos e vacinas. “Para desenvolver todo esse potencial econômico, sem comprometer os diferentes ecossistemas e a biodiversidade marinha, precisamos de mais cooperação entre os diferentes níveis de governo e amplos setores da sociedade”, afirma Fábio Eon, coordenador de Ciências da UNESCO Brasil. 

Em 2017, a ONU declarou o período de 2021 a 2030 como a Década do Oceano, que tem como um dos principais objetivos, justamente, incentivar a geração de conhecimentos para a sociedade. A pesquisa aponta, porém, que apenas 0,3% da população já está informada sobre a Década, enquanto 6% apenas ouviram falar sobre o assunto e 93% não têm conhecimento sobre o assunto. “O estado de conservação do oceano é bastante preocupante. Uma avaliação global da ONU, realizada em 2021, mostrou que precisamos de ações urgentes para reverter o quadro de degradação e ameaça à biodiversidade e aos ecossistemas”, alerta Eon. De forma estimulada, a população respondeu sobre as atividades econômicas impactadas pelo oceano. Aparecem com destaque a pesca (de 0 a 10, tem média 9,3), o turismo e a hotelaria (média 8,6), o transporte e a logística (média 8,0), a indústria (média 8,0) e o empreendedorismo local (média 7,9), compreendendo setores como artesanato, comércio e alimentação. Entre as atividades econômicas mencionadas, a agricultura atingiu a menor média: nota 6,5. Em uma escala de 0 a 10, a média é de 8,6, com uma pequena variação entre as regiões do país – com percepção superior no Nordeste (8,9) e levemente inferior no Centro-Oeste (8,3). Realizadas pela Zoom Inteligência em Pesquisas, as entrevistas ocorreram entre os dias 5 de março e 12 de abril de 2022. Entre os entrevistados, 62% residem em capitais e 41% vivem em cidades litorâneas. A margem de erro é de 2,2% para um nível de confiança de 95%.

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