Cientista diz que setor agrícola é estratégico para mitigar riscos

07/09/2024
Alex Ruane comentou que as tendências atuais são incompatíveis com um mundo sustentável e equitativo e que os sistemas alimentares continuam vulneráveis aos riscos climáticos

Na 7ª Conferência FAPESP 2024, que teve como tema “Mudanças Climáticas e Segurança Alimentar”, o pesquisador da Nasa Alex Ruane comentou que as tendências atuais são incompatíveis com um mundo sustentável e equitativo e que os sistemas alimentares continuam vulneráveis aos riscos climáticos, além das projeções de mudanças climáticas indicarem desafios crescentes. Ruane é pesquisador da Nasa, onde codirige o Grupo de Impactos Climáticos, e ainda é cientista associado do Centro de Pesquisa de Sistemas Climáticos da Universidade Columbia, em Nova York. É também o autor principal do capítulo 12 do 6º Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC AR6), da Organização das Nações Unidas (ONU), com informações sobre riscos climáticos. Ele abordou a necessidade de proatividade no processo de mitigação e adaptação, para o qual as escolhas feitas agora e nos próximos dez anos são cruciais. “Os modelos agrícolas podem nos ajudar a começar a habilitar e implementar ações de adaptação e mitigação que sejam viáveis, equitativas e justas”, disse o pesquisador. 

Para Ruane, o mundo pede cada vez mais que o setor agrícola enfrente um desafio quádruplo, que inclui o aumento da produção de forma sustentável para fornecer alimentos saudáveis para populações em crescimento e desenvolvimento; adaptar-se às mudanças climáticas e aos extremos climáticos em andamento; mitigar as emissões de terras agrícolas e manter incentivos financeiros para a agricultura. O cientista mostrou dados, entre 2011 e 2020, que indicaram que, estes anos foram, na média, 1,1°C mais quentes do que o período entre 1850 e 1900. Caso a tendência continue, o mundo poderá ultrapassar na próxima década o limiar de 1,5°C, a partir do qual lidar com a crise climática se tornará excepcionalmente mais difícil. Cinco cenários se apresentam, então, indo do mais favorável, caso o aquecimento fique abaixo de 1,5°C, ao calamitoso, caso a temperatura média global aumente 4°C ou mais. 

No pior cenário, a frequência de eventos extremos de calor poderá aumentar até 40 vezes, com incrementos de temperatura superiores a 5°C, e chuvas extremas tenderão a ocorrer 2,7 vezes mais, com acréscimo de precipitação de até mais de 30%. “Não é apenas o aumento médio da temperatura global que afeta a produção agrícola e a segurança alimentar. Mas também os eventos extremos suscitados pela crise climática, que exercem um impacto direto sobre as plantações”. Ruane explicou o papel vital dos modelos climáticos e agrícolas no planejamento para o futuro: “Esses modelos permitem que os governos e outras partes interessadas desenvolvam estratégias de mitigação”. 

Um outro ponto importante citado pelo cientista é o fato de que as adaptações necessárias para enfrentar as mudanças climáticas exigem investimentos de longo prazo. Por isso, os formuladores de políticas e os investidores precisam começar a planejar agora, para garantir que as infraestruturas e tecnologias necessárias estejam disponíveis no futuro. A palestra também abordou a justiça social no contexto das mudanças climáticas. Ruane disse que as soluções para os desafios climáticos e de segurança alimentar “devem ser justas e equitativas, garantindo que as populações mais vulneráveis, que são as mais afetadas pelas mudanças climáticas, recebam o apoio necessário”. “A justiça social não é apenas uma questão ética, mas também uma necessidade prática para garantir a sustentabilidade das soluções implementadas”. 

Para concluir, Ruane afirmou que as escolhas que serão feitas para as próximas décadas serão cruciais para determinar o futuro do planeta e das gerações futuras. “Há de se pensar em soluções inovadoras e a trabalhar juntos para enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas e pela insegurança alimentar”, sublinhando a necessidade de colaboração entre governos, setor privado, sociedade civil e comunidade científica

A conferência contou com a presença de Marcio de Castro Silva Filho, diretor científico da FAPESP, e Carlos Alfredo Joly, membro da coordenação do Ciclo de Conferências FAPESP 2024. A moderação foi de Jurandir Zullo Junior, do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura da Universidade Estadual de Campinas (Cepagri-Unicamp). Na abertura do evento, Silva Filho informou que, apesar de o Brasil ser o terceiro produtor mundial de alimentos, apenas atrás dos Estados Unidos e da China, 20% da população do Estado de São Paulo, o mais rico do país, apresentam algum nível de insegurança alimentar. E que 3% padecem de insegurança grave. A boa notícia trazida pelo diretor científico foi que a FAPESP está elaborando um novo programa, focado em segurança alimentar, que deverá se desenvolver em sinergia com outras iniciativas existentes. A 7ª Conferência FAPESP 2024 – “Mudanças Climáticas e Segurança Alimentar” pode ser assistida na íntegra em https://www.youtube.com/live/gsnWaibumWo