Levantamento feito por drones para ajudar no monitoramento de UCs
Uma equipe multidisciplinar da Unicamp reuniu especialistas de sete áreas diferentes e criou um sistema baseado em tecnologias disruptivas, como escaneamento a laser 3D, levantamento de dados por meio de drones, fotogrametria digital, inteligência artificial (IA) e realidade aumentada. Liderado pela arquiteta e urbanista Eloisa Dezen-Kempeter, professora da Faculdade de Tecnologia (FT) da Unicamp em Limeira (SP), o sistema desenvolvido agiliza e torna mais preciso o gerenciamento de áreas protegidas de unidades de conservação (UC) ambiental.
O estudo foi realizado na UC Parque Estadual Ilha Anchieta (Peia), em Ubatuba, litorall norte paulista. Os pesquisadores esperam que o projeto possa virar um modelo para a implantação de políticas públicas de monitoramento, conservação e gestão de áreas com características similares. Segundo dados do governo de São Paulo, o estado possui mais de 30 reservas ecológicas estaduais, somando quase 700 mil hectares de área de proteção integral da natureza destinados à preservação, à pesquisa e ao turismo.
Deste total, o Peia tem 828 hectares cobertos por Mata Atlântica, dos quais 17 km de costões rochosos e sete praias. O parque tem também cinco trilhas terrestres, uma trilha subaquática, diversos pontos de mergulho e quatro mirantes. O Peia recebe perto de 40 mil visitantes por ano.
Dentre as atrações estão as ruínas de um presídio - construído em 1908 - para abrigar presos comuns, mas que srrviu para encarcerar presos políticos durante a ditadura de Getúlio Vargas (1937-45). O presídio registrou uma das maiores tragédias do sistema prisional brasileiro, quando, em junho de 1952, 300 presos amotinados tomaram as instalações da ilha. A revolta provocou a morte de cem pessoas e mostrou-se determinante para o fechamento do local em 1955, após três anos de julgamentos. Criado em 1977, o Peia atualmente é administrado pela Fundação Florestal.
O trabalho de Dezen-Kempeter e sua equipe – tem apoio da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e realiza o mais completo inventário feito até hoje sobre o patrimônio natural e cultural da área. “Nós usamos duas tecnologias diferentes com o intuito de fazer um levantamento físico e geométrico do local. No nível macro, usamos drones, com os quais conseguimos esquadrinhar toda a ilha e medir a regeneração da vegetação. Em outra frente, fizemos um trabalho referente aos edifícios, quando usamos escaneamento a laser para identificar as construções”, explica a professora. Os drones produziram mais de 2.500 imagens – com precisão de 5 centímetros de GSD (ground sample distance, padrão que mede o nível de detalhamento de uma imagem). Esse método é um avanço quando comparado com a modelagem da dinâmica da paisagem do parque feita 12 anos antes, pelo pesquisador Leandro Aranha, que utilizou imagens de satélite com imprecisões que poderiam variar de 5 a 10 metros. As imagens produzidas pelos drones (do tipo quadricópte- ro e de asa fixa) compuseram um mosaico que, feito um quebra-cabeças, foi sendo montado até se obter uma reprodução precisa, bidimensional e tridimensional, de toda a área. Além disso, o procedimento permitiu verificar a existência de eventuais lacunas na vegetação e realizar uma medição mais precisa sobre o ritmo de regeneração vegetal da ilha.
A arquiteta diz que usou tecnologias computacionais baseadas em sistemas de informação geográfica – ferramentas de geoprocessamento que realizam análises a partir da integração de diversos dados e, com isso, conseguem criar bancos de dados georreferenciados. O projeto empregou, ainda, tecnologias de captura da realidade, como sensoriamento remoto com escaneamento a laser 3D – sistema que capta com altíssima precisão as formas de objetos por meio da incidência do feixe de laser, criando uma nuvem densa de pontos 3D. O sistema utiliza também fotogrametria – fotografias de terrenos ou objetos que, processadas, geram modelos tridimensionais com alto detalhamento visual e precisão geográfica, representando com exatidão a realidade da área mapeada.
O projeto utilizou também técnicas para criar ambientes imersivos de realidade aumentada, que mescla imagens virtuais com o mundo real. Essas tecnologias empregam visão computacional, lançando mão da IA para a interpretação de imagens e permitindo a obtenção de dados a partir de entradas como fotografias e vídeos. A IA foi empregada também no reconhecimento de padrões da vegetação, utilizando aprendizagem de máquina aplicada no software ArcGIS Pro, por meio do método de classificação supervisionada baseada em objetos. O resultado tornou possível a modelagem dinâmica da paisagem, que, por sua vez, mostrou uma diminuição no tamanho das áreas degradadas entre os anos de 2008 e 2022. De acordo com a professora, essas tecnologias tornaram possível agregar as pesquisas históricas, arqueológicas e materiais envolvendo a Peia. Desta forma, o projeto propõe apoiar a gestão das UCs do Estado de São Paulo a partir da articulação de três pilares: a salvaguarda do patrimônio natural e cultural, a formação de um inventário dos bens culturais e a promoção da educação patrimonial e ambiental. “Os resultados do projeto poderão fornecer subsídios para o conhecimento dos serviços de regulação, com potencial para a utilização desses dados na elaboração de políticas públicas e de protocolos institucionais”, conclui a arquiteta. .